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24 de julho de 2013

Manifestações internacionais contra a reserva de mercado dos estudos históricos

No mundo todo, não existem precedentes do estabelecimento de uma reserva de mercado dos estudos históricos, limitando esses estudos exclusivamente aos portadores de diploma de História, conforme previsto no Projeto de Lei 4699/2012, que está tramitando no Congresso Nacional.


Em todos os países, é comum que o ensino e a pesquisa de História da Arte, História das Ciências, História da Filosofia, História da Educação e, de um modo geral, história das diversas áreas do conhecimento humano, sejam desenvolvidas por pessoas que não possuem diploma em História. 

Por isso, os pesquisadores de outros países que tomam conhecimento do Projeto de Lei 4699/2012 ficam estarrecidos com a norma, prevista naquela proposta, de que pessoas sem diploma em História devem ser proibidas de exercer o ensino, a pesquisa e outras atividades sobre qualquer tema histórico.

Duas entidades internacionais resolveram se manifestar publicamente sobre esse assunto:

Comitê Internacional de História da Arte (Comité International d'Histoire de l'Art)
Sociedade Européia de História da Ciência (European Society for the History of Science)
   
Apresentamos abaixo os textos completos dessas duas manifestações internacionais. 



Comitê Internacional de História da Arte (CIHA)

Comité International d'Histoire de l'Art (CIHA)



Paris, 12 de julho de 2013

Ao Ministério da Educação do Governo Brasileiro

Prezados Senhores,

O Comitê Internacional de História da Arte (CIHA), especialmente preocupado com ações que visam fragilizar, e até mesmo fazer parecer ilegítima, junto ao Ministério da Educação, a formação de nossos colegas historiadores da arte brasileiros, particularmente no que se refere aos cursos de graduação em História da Arte, vem testemunhar o papel essencial assumido pelas universidades e centros de pesquisa brasileiros no campo do ensino e da pesquisa em história da arte em nível internacional.

Como secretário científico do CIHA, posso atestar com inteira fundamentação que os Arquivos do CIHA que se encontram preservados em Paris, França,no Institut National d'Histoire de l'Art, e que são seguramente a memória da comunidade dos historiadores da arte, documentam a antiguidade e a qualidade das relações que o Comitê Brasileiro de História da Arte (CBHA), fundado pelo saudoso Walter Zanini, sempre teve com os outros comitês nacionais que fazem parte de nossa Associação, uma das mais veneráveis entre as sociedades científicas, pois fundada no Congresso de Viena em 1873.

Entre as cartas de Walter Zanini conservadas nos Arquivos do CIHA, uma endereçada a Albert Châtelet, então Presidente do CIHA, em 2 de julho de 1992, pedia uma “maior representação da América Latina no Bureau (Conselho Diretivo) do CIHA”. Esse voto foi atendido pois a Presidente do CBHA Professora Maria de Fátima Morethy Couto (Unicamp), é hoje um dos membros do Conselho Diretivo composto por apenas uma dúzia de membros representantes de diversas regiões do mundo. Ela sucedeu no posto ao Professor Roberto Conduru (UERJ).

Segue em anexo à minha carta um breve histórico de nosso Comitê e vos encaminho igualmente a nosso web site: 
onde se encontram todas as informações úteis e se pode verificar a realidade indiscutível da atividade de nossos colegas brasileiros.

De fato, eles tiveram papel importantíssimo nos diversos Colóquios e Congressos de nosso Comitê. Eu me refiro ao I Colóquio Internacional de Históriada Arte(CBHA/CIHA, São Paulo, 05-10 set. 1999): Paisagem e arte, ou ainda à presença ativa e numerosa dos colegas brasileiros no último Congresso em Nuremberg (julho 2012). Eles preparam igualmente a organização de um Colóquio Internacional em 2015 no Rio de Janeiro, cujos objetivos e tema foram aprovados em nossa Assembleia geral e por nosso Conselho Diretivo. E visam apresentar candidatura para a organização do Congresso do CIHA 2020, após o congresso que será realizado em Pequim em 2016.

A grande qualidade dos professores-pesquisadores em história da arte no Brasil explica que formem estudantes com os melhores métodos e direcionados às questões mais atuais de nossa disciplina científica em numerosas instituições reputadas (São Paulo, Rio de Janeiro, Campinas, Brasília...). Possuem excelentes relações com instituições de ensino e pesquisa no mundo todo, e o INHA, assim como o Courtauld Institute ou o Getty Research Institute, para citar apenas esses, se felicitam das contribuições dos professores brasileiros que são convidados a dar conferências e a efetivar colaboração internacional entre os programas de pesquisa.

Eu mesmo fiquei muito bem impressionado com a grande atividade e a real emulação que existem na comunidade científica brasileira quando fui convidado a participar do último colóquio do CBHA em Brasília, em setembro de 2012.

Por esses motivos, o Bureau do CIHA e todos os membros do CIHA apresentam seu completo apoio aos historiadores da arte brasileiros que honram as ciências humanas e merecem ter toda autonomia e inteira liberdade para garantir e desenvolver seus cursos de formação e seus programas, tal qual existem em todos os países onde há naturalmente lugar para os historiadores, sociólogos, filósofos e historiadores da arte dentro do respeito de suas competências e da especificidade de seus campos.

Em nome do CIHA, prezados senhores, eu lhes apresento nossos sinceros cumprimentos.

Prof. Thierry Dufrêne
Secretário Científico do CIHA
Comitê Internacional de História da Arte
Institut National d'Histoire de l'Art (INHA)
2 rue Vivienne
75002 Paris
França

Veja o original da carta, em francês:
http://www.cbha.art.br/pdfs/carta_ciha_historiadores_da_arte_frances.pdf

Thierry Dufrêne

Manifestação da Sociedade Européia de História da Ciência (European Society for the History of Science)




Sociedade Européia de História da Ciência (ESHS)
European Society for the History of Science (ESHS)


Pavia, 30 de Julho de 2013

A quem possa interessar

A Sociedade Europeia de História da Ciência (European Society for the History of Science – ESHS) foi notificada a respeito do projeto de lei 4699/2012, discutido no Congresso Brasileiro, referente ao status profissional de historiadores acadêmicos. Devido à forte relação entre os historiadores da ciência europeus e brasileiros, a ESHS deseja endossar qualquer ação para a reforma do projeto de lei mencionado acima, de uma forma positiva para o futuro desenvolvimento da História da Ciência no Brasil.

Desde seu início como tema acadêmico, a História da Ciência sempre foi estudada também por historiadores com formação científica. O papel desempenhado na História da Ciência por cientistas profissionais, tais como Joseph Priestley, Ernst Mach, Pierre Duhem, Albert Einstein, Abraham Pais, Luigi Cremona, Felix Klein, Eugenio Beltrami, Hieronymus Georg Zeuthen e muitos outros, assim como por historiadores com formação científica, tais como Thomas Kuhn e muitos outros, é de importância inestimável. Uma grande parte da comunidade internacional dos historiadores da ciência profissionais é constituída hoje em dia por cientistas cujo trabalho profissional é a pesquisa da história de suas disciplinas. Seu profundo conhecimento do assunto cuja história eles estudam, é uma parte fundamental de seu trabalho e que não pode ser rejeitada. Em particular, naquilo que se refere às épocas moderna e contemporânea, o conhecimento profissional dos aspectos científicos não pode ser subestimado. 

A inclusão da História da Ciência nos programas de ensino e de pesquisa dos departamentos e instituições científicos, assim como sua realização por historiadores educados na ciência, é um fato positivo e comum em muitos países. Existem muitas sociedades nacionais e internacionais dedicadas à história de disciplinas científicas específicas, como História da Física, Matemática, Química, Biologia, Astronomia, etc.

Qualquer restrição do estudo da História da Ciência aos historiadores humanistas somente terá efeitos negativos no futuro dessa disciplina. O papel desempenhado pelo Brasil terá que enfrentar o perigo de se tornar de importância secundária. Devem também ser levadas em conta consequências culturais e econômicas para o futuro do Brasil: a História da Ciência é um assunto fundamental no treino de professores de ciências para as escolas, como está provado por pesquisas pedagógicas em todo o mundo. A limitação ou exclusão de cientistas profissionais que trabalham em universidades brasileiras, centros de pesquisa e outras instituições científicas, tais como observatórios astronômicos, jardins botânicos, museus científicos, etc., será portanto a causa de efeitos negativos também fora do mundo acadêmico brasileiro.

No dia 27 de Julho de 2013, a Assembleia Geral da União Internacional de História e Filosofia da Ciência (International Union of the History and Philosophy of Science), Divisão de História da Ciência e Tecnologia (Division of History of Science and Technology), votou a favor da candidatura do Rio de Janeiro como cidade anfitriã do 25º Congresso Internacional de História da Ciência, Tecnologia e Medicina (25th International Congress of History of Science, Technology and Medicine) em 2017, conforme proposta da Sociedade Brasileira de História da Ciência. Este resultado positivo, do qual o Brasil deve se orgulhar, é um reconhecimento internacional sobre o valor inestimável da atividade de historiadores da ciência brasileiros com educação científica.

O Conselho da Sociedade Europeia de História da Ciência (ESHS Council), em sua reunião realizada em Manchester no dia 26 de Julho de 2013, votou de forma unânime a favor desta recomendação para apoiar qualquer reforma positiva do projeto de lei n° 4699/2012, com a inclusão de cientistas na futura profissão de historiadores acadêmicos no Brasil.

Prof. Fabio Bevilacqua
Presidente da ESHS
European Society for the History of Science
http://www.eshs.org

Tradução: Roberto de Andrade Martins

Veja o original da carta, em inglês:
https://dl.dropboxusercontent.com/u/4072208/ESHS-Brazil-final-English-version.pdf

Fabio Bevilacqua

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